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IBGE pede legislação que assegure a "autonomia de informações" no Brasil

O intuito é estabelecer um Sistema Nacional de Geociências, Estatísticas e Informações

09/07/2024 às 22h00
Por: maurilio fernandes
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IBGE pede legislação que assegure a "autonomia de informações" no Brasil

O líder responsável pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Márcio Pochmann, tem como objetivo iniciar até o final deste mês um projeto de legislação que assegure a proteção dos dados no território nacional. Em outras palavras, ele deseja estabelecer o Sistema Nacional de Geociência, Estatísticas e Dados (Singed), com o propósito de unificar registros de diferentes áreas (como saúde, educação e assistência social) e também ter a capacidade de acessar e gerenciar informações que hoje são exclusivas das grandes empresas de tecnologia (conhecidas como big techs).

Os debates acerca do plano estão agendados para o período de 29 de julho a 2 de agosto, durante a Conferência Nacional dos Analistas, Fabricantes e Consumidores de Informações. Em uma entrevista concedida à Agência Brasil, Pochmann, que foi visitado pela equipe na sede do IBGE em Brasília, manifestou sua expectativa de que o sistema esteja em pleno funcionamento até 2026.

A concretização dessa ideia, de acordo com o especialista em economia, traria uma redução de gastos para o país, além de oferecer mais oportunidades de planejamento tanto para o setor público quanto para o privado. Confira o bate-papo na íntegra.

Agência Brasil - O senhor tem planos para implementar um mecanismo que assegure a proteção dos dados dos cidadãos brasileiros? Poderia explicar melhor esse conceito?

Márcio Pochmann - Acreditamos que o Brasil está passando por uma nova fase de soberania. Anteriormente, há 200 anos, a questão da soberania era predominantemente política. Durante o período colonial, o Brasil dependia de decisões externas, mas com a independência nacional, passamos a ter autonomia para tomar decisões internamente, lideradas por cidadãos brasileiros.

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Quase um século mais tarde, no começo do século XX, surgiu o dilema da autonomia financeira. Os importadores detinham o controle sobre as decisões econômicas relacionadas aos produtos do Brasil. A nossa produção não era voltada para o consumo interno, mas sim para a exportação. Dessa forma, a produção era influenciada, principalmente, pelas circunstâncias externas.

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Neste começo do século XXI, surge um debate acerca da soberania dos dados, devido à era da transformação digital, onde nossas informações pessoais e das organizações se tornaram uma fonte de lucro para um pequeno grupo global que detém o controle desses dados e os utiliza conforme seus próprios interesses, que não correspondem necessariamente aos interesses nacionais.

Atualmente, o Brasil conta com uma ampla gama de informações de extrema importância, porém são informações setoriais que não são integradas. Existem diferentes metodologias devido aos diferentes propósitos de construção. A proposta em que estamos trabalhando é a de reintroduzir a questão da coordenação dos dados oficiais do Brasil, conectando essas diversas bases de dados e registros administrativos, o que permitiria aos administradores públicos e à sociedade em geral ter uma compreensão mais aprofundada da realidade local. Essa é a iniciativa do IBGE: retomar o papel de grande coordenador das informações estatísticas e dados oficiais.

Agência Brasil - Compartilhar informações pode resultar em diminuição de gastos, não é mesmo?

De acordo com Márcio Pochmann, essa ação resultaria em economia de recursos, uma vez que atualmente os bancos de dados estão fragmentados, e proporcionaria maior rapidez para a tomada de decisões, tanto no âmbito público quanto no privado.

Simultaneamente, por meio da elaboração dessa coordenação seríamos capazes de estabelecer o que conhecemos como Sistema Nacional de Geociência, Estatísticas e Dados (Singed).

Portanto, seria não apenas a união dessas informações já armazenadas em bancos de dados oficiais, mas também informações que atualmente não estão disponíveis para nós, como aquelas provenientes das redes sociais pessoais.

Assim, buscamos contato com a rede de telecomunicações do Brasil a fim de promover essa aproximação. O país contaria com um sistema que abrangeria uma variedade de informações e dados disponíveis na era digital.

Agência Brasileira - Qual a maneira de criar um projeto de lei?

Márcio Pochmann - Entre os dias 29 de julho a 2 de agosto, acontecerá a Conferência Nacional dos Agentes, Produtores e Usuários de Informações. Neste evento, o IBGE se reunirá com representantes da comunidade acadêmica, científica e fornecedores de dados públicos e privados, com o intuito de discutir sobre esse sistema.

Caso alcancemos êxito nesse encontro, a proposta é possibilitar ao Congresso a chance de apresentar um projeto de lei.

Essa é a abordagem formal que estamos em busca. Nós temos mantido conversas tanto com o Legislativo quanto com o Poder Executivo para encontrar a forma mais adequada para que esse tema possa ser debatido internamente no Parlamento. A expectativa é de que, no próximo semestre, tenhamos novidades nesse sentido. Após a conclusão da análise, será escolhido o melhor recurso para elaborar o projeto.

Outras nações também estão seguindo essa mesma direção?

Márcio Pochmann - A ONU também está engajada nessa iniciativa. Possuem diversos bancos de informações, como Banco Mundial, FMI, Unesco e Unicef. É necessário haver uma integração desses dados para permitir a comunicação entre as diferentes fontes de informação.

Agência Brasileira - Na sua opinião, as nações em crescimento estão em maior risco diante do domínio das grandes empresas?

Há uma realidade de subdesenvolvimento surgindo a partir dessa agitação possibilitada pela era digital. Por exemplo, o IBGE demora uma década para realizar um censo e mais um ou dois anos para organizar e disponibilizar todas as informações. Enquanto isso, as grandes empresas de dados exigem que os usuários aceitem suas políticas de privacidade para acessar as redes sociais, o que basicamente significa concordar que seus dados não são de sua propriedade.

São informações não processadas sobre escolhas feitas em relação à seleção de um aplicativo específico para locomoção, compras efetuadas, métodos de pagamento e canções ouvidas pela pessoa.

Trata-se de informações iniciais, porém essas empresas de grande porte possuem a capacidade de utilizá-las através de algoritmos avançados ou até mesmo inteligência artificial. Com essa análise, é possível desenvolver um plano de negócios.

Porém, o que compreendo, de fato, sobre os dados, é que o IBGE realiza um levantamento (a cada década), ao passo que as gigantes da tecnologia realizam um levantamento diário.

Agência Brasileira - E são organizações que não possuem presença no território brasileiro.

Márcio Pochmann - Estas grandes empresas mal possuem seus registros armazenados no país. Elas praticamente não contratam funcionários, não contribuem com impostos. Ao mesmo tempo, essas informações não processadas retornam posteriormente sob a forma de um modelo de negócio altamente rentável.

Entre as dez principais empresas listadas na Bolsa de Valores dos Estados Unidos, sete pertencem ao setor de tecnologia. Os países do Hemisfério Norte têm normas mais rígidas em comparação com o Sul Global, onde ainda há poucas iniciativas nesse sentido. Esse tema tem sido debatido no âmbito do grupo Brics, que reúne economias emergentes de todo o mundo, incluindo o Brasil, como uma proposta de organização mais justa e igualitária.

Agência Brasil - Em sua opinião, quais são as informações às quais estamos mais expostos em termos de vulnerabilidade e que essas empresas podem acessar?

Márcio Pochmann - Inicialmente, diariamente, essas organizações realizam um tipo de levantamento nacional. Elas possuem dados de todos os usuários de internet, suas escolhas de compra, destinos de viagem, ou seja, informações essenciais para quem deseja planejar.

A forma de averiguar quantas pessoas foram afetadas, suas ações e meios de locomoção durante a tragédia no Rio Grande do Sul, por exemplo, é através do rastreamento dos dispositivos móveis.

A ausência destes dados prejudica a nação, pois impossibilita uma resposta ágil diante de situações que ainda são tratadas de maneira analógica e não digital.

No entanto, surge a indagação de que atualmente corporações estrangeiras possuem um conhecimento mais profundo sobre o país do que as próprias autoridades. Estas corporações possuem objetivos econômicos. A preservação da soberania torna-se crucial. Eu afirmaria que, no âmbito da independência de quem governa a nação.

Agência Brasil - Considerando que o sistema inclui alguma forma de supervisão, o projeto não pode ser questionado nesse aspecto?

Em nossa situação, gostaríamos de destacar que o IBGE segue rigorosamente a Lei de Sigilo. Visitamos cerca de 90 milhões de domicílios brasileiros e todas as informações coletadas são mantidas em total sigilo.

A identificação do acesso desejado é anônima. Não será viável identificar os usuários de dispositivos móveis, por exemplo.

Este é um princípio fundamental para analisar os dados estatisticamente. O objetivo do controle vai além, pois está relacionado à compreensão da base democrática. O que ocorre é que a eficácia do algoritmo foi confirmada em contextos anteriores, incluindo em eleições.

Agência Brasileira de Notícias - As informações podem trazer vantagens tanto para o setor público quanto para o privado, não é mesmo?

Márcio Pochmann - Analise um exemplo prático: os visitantes estrangeiros chegam ao Brasil rastreados pelos chips de seus celulares. Dessa forma, é viável identificar a origem da viagem e o destino final dos turistas. Essa abordagem se mostra altamente eficaz para a gestão de políticas públicas voltadas ao turismo.

É possível também monitorar o movimento das pessoas: a que velocidade, quantas pessoas e em quais horários. Esses dados são essenciais para tomada de decisão, tanto no setor público quanto no privado.

Qual é a melhor localização para abrir uma loja? Onde há maior circulação de pessoas? Esses dados são essenciais para orientar as decisões do setor privado. Vale ressaltar que é possível obter tais informações sem violar o sigilo estatístico e, consequentemente, a privacidade das pessoas.

A responsabilidade desse sistema seria do IBGE?

Márcio Pochmann - Sim. É a organização com reputação que visita as residências das pessoas. Elas compartilham informações porque confiam que não serão divulgadas ao público.

Não confiamos plenamente nas empresas privadas, pois há relatos no Brasil de uma organização que promete preços mais baixos e solicita o CPF dos clientes, com posterior venda desses dados. Esta situação não se aplica ao IBGE, já que não há acusações nesse sentido sobre o órgão.

Você acredita que o país está sofrendo um impacto financeiro negativo por conta disso?

Márcio Pochmann afirma que, de fato, há um repasse de recursos em forma de royalties. Com a coordenação do recente sistema nacional de geociência, seria possível diminuir os gastos devido à existência de diversos bancos de dados, muitos deles operados por empresas privadas. O objetivo é alcançar uma significativa redução nos custos.

Agência Brasil - Você tem uma estimativa de quanto tempo levará para colocar em prática esse sistema?

Márcio Pochmann - Almejamos que o sistema esteja pronto até 2026, ano em que o IBGE celebrará nove décadas de existência.

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