Segunda, 17 de Novembro de 2025
21°C 26°C
Hortolândia, SP
Publicidade

Infância à Venda: o que a denúncia de Felca revela sobre a adultização e o risco jurídico dos responsáveis

Quem lucra com a exposição de crianças não cria conteúdo — comete um crime

Jéssica Leire Uga
Por: Jéssica Leire Uga
01/09/2025 às 10h02
Infância à Venda: o que a denúncia de Felca revela sobre a adultização e o risco jurídico dos responsáveis
Advogada: Jéssica Leire Uga

Uma infância exposta, moldada por likes e monetizada como produto de consumo. Essa é a realidade brutal revelada pelo influenciador digital Felca (Felipe Bressanim) em seu vídeo explosivo publicado em agosto de 2025. A denúncia viralizou, mas o que talvez muitos ainda não compreendam é que a chamada “adultização infantil” não é apenas uma questão ética ou social: ela pode configurar crime, gerar ações judiciais e até levar os responsáveis à prisão.

Felca denunciou a exposição indevida de crianças nas redes sociais, criticando como pais, responsáveis e criadores de conteúdo utilizam a imagem de menores em contextos muitas vezes sexualizados, coreografados de forma inapropriada ou forçados à precocidade de comportamentos adultos. Influenciadores como Hytalo Santos, já investigado anteriormente, foram novamente colocados no centro da polêmica e, neste caso, presos dias depois, por suposto envolvimento com exploração de menores.

Mais que polêmica, o vídeo de Felca gerou um efeito dominó: mobilizou o debate público, motivou projetos de lei, pressionou plataformas digitais e provocou reações imediatas do Ministério Público, do Judiciário e até da Assembleia Legislativa da Paraíba, que aprovou a chamada Lei Felca, visando coibir esse tipo de exposição precoce e prejudicial.

Adultização infantil: o que é e por que é grave? O termo adultização infantil refere-se ao processo de aceleração da maturidade emocional e sexual das crianças, frequentemente provocado por influências midiáticas, modas e comportamento dos próprios responsáveis. Quando isso ocorre de forma pública, comercializada e sem o devido cuidado com o bem-estar psicológico do menor, pode configurar violação de direitos fundamentais.

A Constituição Federal (art. 227) estabelece que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, com absoluta prioridade, o direito à dignidade, ao respeito e à proteção contra qualquer forma de exploração. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reforça essa proteção e criminaliza condutas que exponham crianças a situações vexatórias ou que atentem contra sua dignidade.

O que diz a lei e quais as possíveis punições? A partir da denúncia de Felca, surgem diversas frentes de responsabilização para os envolvidos:

1. Responsabilidade criminal

             A exposição sexualizada ou exploração da imagem de crianças pode ser enquadrada como crime previsto nos artigos 240 e 241 do ECA, com penas que vão de 4 a 8 anos de prisão, além de multa.

             Quando há indícios de assédio, abuso, tráfico humano ou conivência dos responsáveis, os envolvidos podem responder também por crimes previstos no Código Penal, como corrupção de menores e exploração sexual.

2. Responsabilidade civil

             As famílias e criadores podem ser processados por danos morais e psicológicos causados às crianças. A Justiça pode determinar indenizações, retirada de conteúdo e proibição de exposição futura.

             Em casos mais graves, pode haver perda da guarda ou suspensão do poder familiar, quando a integridade da criança é colocada em risco.

3. Responsabilidade administrativa

             Conselhos tutelares e o Ministério Público podem aplicar medidas protetivas, advertências e recomendações aos pais ou responsáveis.

             Plataformas digitais também podem ser responsabilizadas por não coibirem a disseminação de conteúdo inadequado envolvendo menores.

4. Legislação em movimento

             No Congresso Nacional, já tramitam ao menos 32 projetos de lei que buscam regulamentar a exposição de crianças na internet, impedir a monetização de conteúdos que envolvam menores e responsabilizar as redes sociais por omissão.

             O mais simbólico deles é o que ficou conhecido como “Lei Felca”, já aprovado em âmbito estadual na Paraíba, e que poderá servir de modelo nacional.

O perigo da monetização da infância, por trás da câmera e dos filtros, muitas vezes está uma criança sem voz, transformada em produto. O conteúdo gerado pode parecer “inocente”, mas, na prática, ao ser direcionado para públicos adultos e sexualizado, representa um ciclo de exploração com consequências irreparáveis.

A monetização desses vídeos agrava o problema: torna-se um incentivo econômico à continuidade da exposição. E, na lógica das redes, quanto mais polêmico o conteúdo, maior o alcance e mais lucro. É UM CICLO PERVERSO.

Concluo, não é só um post e sim um possível crime, o alerta feito por Felca mostrou que o problema é real, grave e urgente. Mas também revelou uma verdade incômoda: há adultos LUCRANDO com a perda da infância de seus filhos. A Justiça brasileira, a sociedade e o Legislativo começam agora a reagir, ainda que tardiamente.

Pais, produtores de conteúdo e empresas precisam compreender que a exposição de crianças não é isenta de responsabilidade. O futuro dos menores depende da proteção dos seus direitos, hoje, inclusive, contra os próprios algoritmos e contra quem deveria zelar por eles.

* O conteúdo de cada comentário é de responsabilidade de quem realizá-lo. Nos reservamos ao direito de reprovar ou eliminar comentários em desacordo com o propósito do site ou que contenham palavras ofensivas.
500 caracteres restantes.
Comentar
Mostrar mais comentários